segunda-feira, 19 de outubro de 2015


Caros, de certo modo dou por encerrada minha atividade nesse blog, já que me dispus a concentrar as publicações e as minhas áreas de trabalho em um único site.
Espero contar com a presença e a contribuição de vocês nesse novo espaço!

Página de Mathias de Alencar

quinta-feira, 21 de maio de 2015

O (triste) caso do leitor brasileiro


Quem por aqui se aventure em se tornar um razoável conhecedor de literatura, terá inevitavelmente que se deparar com algumas das muitas dificuldades que encontrei. A primeira delas diz respeito à nossa própria literatura: as letras no Brasil, embora tivessem sua época de glória nacional sobretudo até pouco mais da metade do século XX, hoje estão quase completamente imersas em versões adolescentes de thrillers americanos ou em pastiches de literatura de verdade, nas figuras indeléveis dos senhores Coelho e Veríssimo. A própria expressão "literatura de verdade" soa esquisito entre nós: quem poderia dizer o que é de fato esse "de verdade" literário? No Brasil, é sempre mais fácil reunir sob o mesmo quesito, ou na mesma estante, as obras monumentais de um Dostoiévski e as incursões ginasianas de escritores ditos teens. Se é verdade que sem um critério de avaliação que seja melhor do que os oferecidos pelas livrarias nenhuma esperança pode haver para a cultura superior, deve ser irresistível pensar que ao brasileiro é oferecida uma ausência de critério exatamente para destruir-lhe a capacidade crítica.

E as livrarias tem papel imprescindível nessa destruição do senso de medida literário. A divisão entre livros para um público segundo a faixa etária soa ofensivo a obras de grande peso, como quando os livros de J. R. R. Tolkien são postos entre os infanto-juvenis ou quando se encontra assustado o diário da Surfistinha entre os clássicos da literatura brasileira. Essa divisão, meramente comercial, é bom que se diga, não deveria ter maiores impactos em quem resolve se educar literariamente. Todo o apaixonado por livros, que os tenha no mínimo que seja em sua casa, já os dispôs de uma certa forma, em uma certa ordem própria, isso quando há a preocupação de os organizar. Em uma livraria não é diferente. Mas os padrões de mercado não deveriam, vale repetir, ter impacto sobre nossa forma de educação para as letras: isso, porém, não seria mais provável de acontecer em um lugar onde se perdeu, com o tempo ou por ação planejada, os critérios de avaliação estéticos. Se em terra de cego quem tem olho é rei, aquele capaz de encontrar e diferenciar a beleza da sua imersão fantasmagórica consentida por entre a feiura generalizada não só encontrará juntamente a beleza de sua própria alma, mas a riqueza e o sentido real de ser humano.

Contudo, não é apenas quanto à classificação que as livrarias exercem influência sobre o gosto literário: pela própria demanda econômica que diz respeito ao mercado editorial e de venda de livros, há clara distonia de oferta de obras, nacionais e estrangeiras. O primeiro grande entrave ao público mais amplo é que os livros serão lidos por aqui à medida que sejam traduzidos. As sessões de livros importados, em língua original, são ramo apreciado pelos poucos que se sentem dispostos a aperfeiçoar um segundo idioma pela leitura. Diminuído assim o seu acesso, fica-se à cargo do que as editoras se acreditam interessadas em publicar pelo interesse que, supostamente, o público demonstraria em consumir. As ondas inconstantes do gosto popular são, ao mesmo tempo, determinadas e determinantes para o que se põe nas prateleiras das livrarias. Essa dialética de interesses, no fim das contas, tende a produzir a distonia de que falava: de muito menor interesse e apreço de nossa parte, a literatura brasileira encontra-se reduzida em sua oferta, quando se tem sempre com mais facilidade um novo lançamento estrangeiro antes que uma obra valorosa em nossas letras, como nas tentativas que se pode fazer de procurar as obras de Lima Barreto. Isso mesmo dito de um dos mais conhecidos de nossos autores: o que não se chegaria a dizer de um José Geraldo Vieira, grande tradutor de Dostoiévski e brilhante escritor, inexistente em grande parte do acervo livreiro atual?

Em alguma medida, os livreiros tem razão: literatura brasileira não vende. De interesse quase restrito a acadêmicos e estudiosos, os autores brasileiros chegam a ser desconhecidos do grande público, que muitas vezes não saberia dizer-lhes nem o valor, que dirá os nomes! As escolas são, em boa medida, uma causa provável dessa ojeriza que o público brasileiro sente por sua literatura. Incentivando os mais jovens ao trato com obras de peso como Machado de Assis ou Guimarães Rosa, em vista não de lhes extrair a experiência poética ou existencial, mas tão-somente em vista de aspectos sócio-políticos ali presentes ou do imaginário do autor, que se vai criticado enquanto primitivo ou folclórico, alguns outros louvados porque não possuem mitos, mas tecem a realidade nua e crua, o aluno chega a suspeitar de que literatura brasileira é mesmo isto, objeto de constante estudo e análise acadêmica e escolar, e nada além disso. Saído da escola como quem sai de um sistema prisional, essa pobre alma não vê graça alguma em voltar ao território estranho das letras de sua língua mãe.

Mas há, não obstante, uma culpa pertencente aos próprios escritores: as histórias são quase sempre desinteressantes, ou muito remotamente atraentes, a exigirem do leitor nacional uma dada postura de espírito que tem de ser similar àquela da região em que se passa. Quem já sentiu na pele a linguagem de Guimarães Rosa a beirar o intragável sabe que o esforço de regionalizar as letras pode ter um sentido inverso ao pretendido: pode levá-lo a se regionalizar em seu mundo, limitando o alcance de sua obra. Mas o esforço para ler Guimarães não é diferente, em certa medida, daquele que se tem para ler Machado de Assis, ainda que por motivo diverso: a linguagem de Machado não é propositalmente regional, mas é distante de nós. No fundo, nós é que nos distanciamos de seu valor. A riqueza literária de Machado chegou a ser incomparável em relação ao que veio depois. O autor de Dom Casmurro é, para muitos e para mim, nosso grande escritor. Mas como chegamos a estar assim tão afastados dele? Como poderíamos no recusar a uma formação pelas letras machadianas, quando até hoje os anglo-saxões se formam por Shakespeare? O erro não estaria em nós, que muito pouco valorizamos o idioma e sua beleza, que já perdemos a sonoridade da língua, sua flexibilidade e ambiguidade, as inúmeras possibilidades que desencadeia e que já estão em grande parte exercidas pelos nossos grandes escritores? Não deveríamos, por isso, nos aproximar cada vez mais de Machado e dos outros ao invés de nos distanciarmos? A responsabilidade dos autores em trazer como enredo histórias pouco interessantes, em uma forma de dizer lapidar, se mistura ao pouco interesse que alimentamos hoje em exercitar essa mesma forma de dizer que não só nos aproximaria deles como de nós mesmos, na pouca graça que se vê em tais enredos, tirados de nossa própria existência. A literatura é quase sempre reflexo da sociedade em que nasce - talvez sejamos isso mesmo: desinteressantes ainda que virtuoses na linguagem. O mais terrível é que parecemos estar nos distanciando também desta virtuosidade.

O pouco interesse que a literatura brasileira desencadeia em nós é desequilibrado constantemente pelo teor de profundo interesse que nos comove à leitura as obras estrangeiras. Nomes como Shakespeare, Goethe, Dostoiévski, Proust, Garcia Marques e Pessoa, ou os menos clássicos, embora não menos vendáveis por seu interesse, Rowling, Tolkien, Martin, Meyer, também Sparks, Roth, Green. Uma rápida procura pelos mais vendidos por aqui põe, ao lado destes estrangeiros, a "variedade de interesses" literários do brasileiro, que vai de Isabela Freitas e outros autores teens até os nomes mais conhecidos de Coelho, Veríssimo e dos recém-falecidos Rubem Alves e Ubaldo Ribeiro, que figuram nas listas junto aos nada literários Augusto Cury, Marcelo Rossi e Edir Macedo. Tudo bem que se chegue mesmo a não ver sentido algum em gastar alguns dias com a leitura de A MoreninhaCaetés ou Perto do Coração Selvagem. Que se entenda pedante as elucubrações de Veredas ou o enciclopedismo de A Ladeira da Memória, para alguns até mesmo sem razão de ser um morto recontar sua vida como em Memórias Póstumas. Mas a lista daqueles por quem os jovens leitores se interessam no Brasil - e digo "jovens" em sentido figurado, para contemplar até mesmo os de idade madura que, em menor número de leitores em relação aos de menos idade, segundo pesquisa recente, são por isso mesmo ainda juvenis em uma prática para a qual deveriam "amadurecer" - não chega a trazer senão uma ausência completa dos clássicos mencionados, com alguma exceção do já clássico O Pequeno Príncipe, que atingiu incríveis vendagens nos últimos anos. Em outras palavras, o que se vê entre nós não é a recusa de nossos clássicos, chatos e pedantes, pelos clássicos estrangeiros: estes são igualmente ignorados pelo público, ainda lidos a não ser pelos mesmos acadêmicos que consomem nossa literatura, chata e pedante. Os clássicos, aqui, é matéria de estudo, não de formação.

O problema que parecia tender em boa parte às instituições, como livrarias e escolas, ganha aqui uma nova dinâmica de realização. O que se percebe é um ciclo vicioso que impede os novos leitores de alcançarem juízos de valor sobre as obras literárias que leem e lerão e, por isso mesmo, influencia de certa forma o mercado editorial e livreiro, encerrando o ciclo nas escolas que, talvez tentando começar um processo diferente, não vê muita oportunidade na escassa oferta das obras fundamentais, alienando com isso seus alunos. Pode-se, no entanto, entender este círculo vicioso, tal como ele se dá na cultura em geral, como se iniciasse no papel que as escolas atribuem ao valor da literatura e aos mecanismos que viabilizam o primeiro acesso dos alunos aos livros. Não é, de modo algum, enquanto objeto de estudo que a obra literária deve ser enfocada nas primeiras idades, e sim como expressividade existencial, como elaboração, pela linguagem, de vivências e conflitos a que cada um de nós está sujeito, e com a qual se pode mesmo aprender a dizer o que se passa conosco. As letras, como objeto de estudo, devem ser prioridade do período universitário. O aluno do ensino fundamental e médio precisa conhecer, antes, a funcionalidade da linguagem poética e imaginária, de que a literatura é um veículo comum e amplo. Ler a literatura brasileira como um repositório das vivências e dos conflitos a que estamos lançados em solo pátrio é abrir-se para a dinâmica que nos constitui mais propriamente. As letras brasileiras são a melhor forma de nos conhecermos, e recusá-la pelo estrangeiro é não querer ter de se olhar ao espelho.

Não poderia negar, contudo, que tenha de haver um convívio virtuoso, e não alienante, com a literatura de outros povos. Enquanto atraente por ser, em certa medida, diferente de nós, ofertando-nos tipos humanos que destoam da mesquinhez e vilania que quase sempre encontramos em nós e pela vizinhança, as letras estrangeiras nos servem para criar exatamente o sentimento de estranheza que deve nos incomodar a querer mudar. Sem isso, olharíamos o mundo apenas pela ótica estreita e caipira de um provincianismo que beira o esquecimento de si, e as consequentes soberba e pequenez moral que todo esquecimento põe em marcha. A literatura é remédio para o autoconhecimento, mas em uma medida que hoje parece haver se perdido, seja porque não se lê mais em vista de se olhar ao espelho, seja porque são muito poucos os espelhos produzidos que satisfazem a transparência apropriada para nos enxergarmos com o máximo de nitidez possível. São a estes que chamei acima de "literatura de verdade": se em uma escala menor a medida da "verdade" parece dizer respeito a quem lê, no âmbito mais elevado da crítica literária não é possível que se possa continuar a deixar ao sabor da escola, do mercado e do leitor a alienação de valores que põe lado a lado Machado de Assis e Veríssimo, Tolkien e Meyer, Shakespeare e Sparks. A continuar assim, já não haverá mais espelhos: onde todos são cegos, não há quem possa enxergar um palmo à frente. Se o público continuar a neglicenciar os critérios de avaliação que diferenciam aqueles pares em larga escala, não pode haver esperança de que algum dia as letras voltarão a servir para o nosso desenvolvimento, como pessoa e como nação.

terça-feira, 22 de abril de 2014

Brasil, um país de...


Às vezes soa esquisito ou mesmo ingrato, confesso, ter de apontar tão-somente os defeitos da "pátria amada" que nos criou e nos deixa ainda viver. Confesso que tento aprimorar os bons olhos de minha alma para não ver a queda vertiginosa que a cultura brasileira vem sofrendo nos últimos anos, sem uma música ou uma literatura que prestem, sem qualquer indícios de uma casta pensante lúcida e uma plêiade de artistas bem dotados quer do mais vasto trato com o popular, quer do mais elevado diálogo com a transcendência. Todo aquele que tem um mínimo conhecimento das sociedades humanas sabe que nenhuma cultura pode chegar a sobreviver sem tais indivíduos, e não seria de todo impróprio dizer que em um futuro próximo, a continuar o atual estado de coisas, a vida brasileira se tornará tão infrutífera como são os desertos. E a imagem talvez renda seus frutos: pois se nos desertos a fauna e flora precisam se adaptar a fim de poderem suportar os escassos recursos, também nós por aqui precisamos nos adaptar, se queremos preservar alguma sanidade. Em um lugar onde falta produtividade cultural, abundam as salivas animalescas dos famintos sem espírito.
A falta de vida cultural não é tão facilmente diagnosticada, sobretudo por quem desconheça o que seja uma vida cultural. No caso do Brasil, contudo, um estudante atento rapidamente vai perceber pelas aulas de história e de literatura que a cultura brasileira durante os anos 20 até os anos 60 e 70 foi um oceano de grandes mentes, de discussões políticas e artísticas que vieram a formar gerações, e que hoje não passam de um capítulo nos livros didáticos, sem que saibamos muito bem como aquilo poderia ter acontecido e como é que fazemos acontecer de novo. Muitos duvidariam da necessidade de uma tal efervescência cultural vir a se realizar em nossos dias. O deserto produz miragens. É por isso que enxergamos em Paulo Coelho ou em Veríssimo os maiores representantes das letras tupiniquins, sem nos esquecermos de Caetano e de Chico, elevados ao posto de grandes poetas por quem nunca parou para ler grande poesia. Na falta de água em meio à seca, qualquer líquido pode satisfazer a sede.
O reflexo dessas miragens luxuriantes, e demasiadamente compensadoras, se projeta no meio social quando tivermos que lidar com as situações do nosso dia a dia. Como ao ler pesquisas, por exemplo, sem que saibamos avaliar o que dizem realmente os dados, isso se eles não vierem falseados com algum interesse obscuro, como foram os últimos dados do IPEA. O desagrado com o resultado de pesquisas do IBGE tem feito o governo preterir verbas para a instituição, talvez para mostrar ao IBGE que é o modo à la IPEA que mais lhe interessa agora. Isso porque é preciso falsear os dados, superfaturar obras para a Copa e promover um rombo na Petrobrás muito maior que qualquer mensalão poderia cobrir. Deve-se mesmo esvaziar os cofres públicos e subjugar as forças policiais e a suprema corte, promovendo a mais generalizada corrupção que já se viu por aqui. Afinal, um povo com fome e sede não encontra forças para lutar e, em meio ao deserto do real em que estamos nos encerrando, o oásis que a terra brasileira produz vai parar nos bolsos da politicalha. 
Nada poderia retratar em alto e bom som a miséria desse país que dois fatos recentes bastante simbólicos. O primeiro deles veio devido aos dados falseados da pesquisa do IPEA, quando ativistas decidiram lutar contra a cultura e a opressão machistas por meio de uma campanha "Não mereço ser estuprada". Pois se a campanha tinha o enfoque de não culpar as mulheres pela violência dos homens, há aqui um problema: se as ativistas defendiam não merecer serem estupradas, deixava-se subentendido que as vítimas de estupro de algum modo mereceriam! Mas as incoerências não param aí. O segundo caso é ainda mais simbólico: o tal "professor" de filosofia que intitulou a Popozuda como "grande pensadora contemporânea" não mostrou a mínima compreensão de que o trecho escolhido do funk era ele mesmo uma prova da falta de pensamento, ainda que fosse pequeno. Alguém que não entenda que "tiro, porrada e bomba" nada tem de pensamento nem deveria se aproximar da filosofia... Mas o descaso e a inércia por aqui são tão grandes que não posso me arrepender de trazer de novo nossos defeitos ao invés das grandes coisas. Porque enquanto se assiste à TV e se espera ansioso pelo hexa da seleção, o que tem acontecido de realmente grandioso está a nos prejudicar. Ainda que não possamos enxergar o país do futuro nesse deserto brasileiro, a terra prometida tem sido uma miragem, porque dela somos privados, como os judeus no Egito, por nossa própria ignorância.

sábado, 7 de dezembro de 2013

AS DEZ ESTRATÉGIAS PARA A MANIPULAÇÃO E O CONTROLE DA OPINIÃO PÚBLICA



1 – DISTRAÇÃO

Um dos principais componentes do controle da opinião pública é a estratégia da distração fundamentada em duas frentes:
Primeiro, desviar a atenção do público daquilo que é realmente importante oferecendo uma avalanche de informações secundárias e inócuas, que como uma cortina de fumaça esconde os reais focos de incêndio.
Em segundo, distrair o público dos temas significativos e impactantes tanto na área da economia  quanto da ciência  e tecnologia (tais como psicologia, neurobiologia, cibernética, entre outras).
Quando mais distraído estiver o público menos tempo ele terá para aprender sobre a vida e/ou para pensar.

2 – MÉTODO PROBLEMA-REAÇÃO-SOLUÇÃO.
Cria-se um problema ou uma situação de emergência (ou aproveita-se de uma situação já criada) cuja abordagem dada pela mídia visa despertar uma determinada reação da opinião pública.
Tal reação demanda a adoção de medidas imediatas para a solução da crise.
Usualmente tais medidas já estão praticamente prontas e são aplicadas antes que a população se dê conta de que essa sempre fora a meta primordial.
Por exemplo:
  • Valer-se de atentados terroristas para sequestrar da população seus direitos civis. (Depois de 11 de setembro qualquer cidadão em solo norte-americano pode ser “detido para averiguações” fora ou dentro de sua residência, sem direito a advogado, ou defesa, exatamente como o que ocorria no Brasil durante a ditadura militar – basta que se acione a tal lei da Segurança Nacional).
  • Valer-se do crescimento da violência urbana para aprovar leis de desarmamento completo da população civil.
  • Valer-se de crises econômicas para fazer retroceder os avanços conquistados nas leis trabalhistas e promover o desmantelamento dos serviços públicos de assistência aos mais pobres.

3 – GRADAÇÃO 
É uma estratégia de aplicação de medidas impopulares de forma gradativa e quase imperceptível.
Por exemplo, entre 1980 e 1990 foram aplicadas medidas governamentais que desembocaram no perfil de estado mínimo, privatizações dos serviços públicos, precariedade da ação do estado (principalmente na segurança, saúde e educação), flexibilidade das leis trabalhistas, desemprego em massa, achatamento salarial, etc.

4 – SACRIFÍCIO FUTURO
Apresentar com muita antecedência uma medida impopular que será adotada no futuro sempre de forma condicional, porém com contornos nefastos.
Primeiro para dar tempo para que o público se acostume com a ideia e depois aceitá-la com resignação quando o momento de sua aplicação chegar.
É mais fácil aceitar um sacrifício no futuro do que um sacrifício imediato tendo-se em conta que existe sempre uma esperança, mesmo que tênue, de que o sacrifício exigido poderá ser evitado ou que os danos poderão ser minimizados.
Por exemplo:
Antes da aplicação de um aumento de 10% na tarifa de energia elétrica:
Se o clima não mudar teremos aumento de 25% no preço da tarifa de energia.
Na aplicação do aumento da tarifa: 
Devido a um esforço coletivo do governo federal e estadual o aumento acabou se concretizando em apenas 10%.

5 – DISCURSO PARA CRIANÇAS
Emprego de um discurso infantilizado, valendo-se de argumentos, personagens, linguagens, estratégias, etc. como que dirigido a um público formado exclusivamente por crianças ou por pessoas muito ingênuas.
Quando um adulto é tratado de forma afetuosa como se ele ainda fosse criança observa-se uma tendência de uma resposta igualmente infantil.

6 – SENTIMENTALISMO E TEMOR
Apelar para o emocional de forma ou sentimentalista ou atemorizante com intuito de promover um atraso tanto na resposta racional quanto do uso do senso crítico.  Geralmente tal estratégia é aplicada de forma combinada com a número 4 e/ou número 5.
A utilização do registro emocional permite o acesso ao inconsciente e  promove um aumento da suscetibilidade ao enxerto de ideias, desejos, medos e temores, compulsões, etc. e à indução de novos comportamentos.
Exemplo:
Para prevenirmos a ação de terroristas todos os passageiros serão submetidos a uma rigorosa revista antes de embarcar. Colaborem!

7 – VALORIZAR A IGNORÂNCIA E A MEDIOCRIDADE
Manter em alta a popularidade de pessoas medíocres e ignorantes aumentando sua visibilidade na mídia, para que o estúpido, o vulgar e o inculto seja o exemplo a ser seguido principalmente pelos mais jovens.

8- DESPRESTIGIAR A INTELIGÊNCIA
Apresentar o cientista como vilão e o intelectual como pedante ao mesmo tempo em que populariza a caricatura do “nerd” ou “CDF”  como pessoas ineptas do ponto de vista social e um exemplo a não ser seguido pelos mais jovens — estimulando, por um lado, a negação da ciência e, por outro, o desprestígio do uso da racionalidade e do senso crítico.
Geralmente tal realidade se coaduna com a oferta de uma educação de menor qualidade para a população mais pobre – que não se queixa disso por que é moda ser ignorante.

9- INCENTIVAR E INCUTIR A CULPA 
Incutir, incentivar e reforçar a culpa do indivíduo quando do seu fracasso, dividindo assim a sociedade em duas categorias: a de vencedores e a de perdedores.
O “perdedor” (ou loser em inglês) é o indivíduo que não possui habilidades ou competências para alcançar o sucesso que o outro tem.
Daí a grande visibilidade que a mídia oferece a modelos minoritários de beleza e sucesso.
Recordando que apenas alguns poucos seres humanos podem ser enquadrados nesse modelo tão rigoroso que categoriza, discrimina e impõe o que é belo, jovem, célebre e bem sucedido.
O restante da humanidade deve se conformar com sua condição de perdedor e carregar com resignação esse seu status.
Ao invés de rebelar-se contra o sistema econômico, o individuo resigna-se e conforma-se com sua situação pessoal, social e econômica, atribuindo seu “fracasso” à sua completa incompetência. Culpar-se constantemente por isso, atua na formação de um desejado estado depressivo, do qual, origina-se a apatia.

10- MONITORAÇÃO
Por meio do uso de técnicas de pesquisa de opinião, mineração de dados em redes sociais e também dos avanços nas áreas de psicologia e neurobiologia, os donos do poder tem conseguido conhecer melhor o comportamento do indivíduo comum muito mais do que ele mesmo.
A monitoração deste comportamento além de alimentar os dados que aperfeiçoam seu modelo psicossocial, oferecem informações que facilitam o controle e a manipulação da opinião pública.

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Um olho na tv, o outro no vizinho



O velho sonho de alguns poucos poderosos em dominar o restante da humanidade parece hoje estar em vias de profunda realização. Isso porque não só as riquezas se aglomeram em mãos cada vez mais reduzidas, como também os meios de controle e disseminação cultural alcançaram níveis nunca dantes imaginados. A um César romano ou a um Gengis Khan sequer ocorreria pensar nas possibilidades que as câmeras, a mídia e a internet hoje disponibilizam para quem se aprouver desses meios - para o benefício de quem mesmo? Nesse contexto, a cultura e os mecanismos de aculturação se tornam decisivos para os intentos de domínio, ou de simples mudança de comportamento, que no fim das contas não deixa de ser uma forma de domínio.
Ainda ontem, o 'Fantástico' - que de fantástico mesmo só tem o nome - apresentou uma 'reportagem' sobre a maneira como as pessoas nas ruas se comportam frente a uma situação privada, em que a mulher tenta impedir que o marido bêbado assuma a direção do carro do casal. Em dois dias de encenação, apenas três pessoas resolveram intervir na situação, e as imagens e comentários sobre inúmeros acidentes de carro, que permearam a reportagem com o intuito nada mascarado de nos sensibilizar, faziam destas três pessoas agentes de transformação social dignos de uma condecoração de cidadãos exemplares.
Exatamente: não resta dúvidas de que a finalidade da 'reportagem' global fora modificar o comportamento das pessoas, a fim de que intervenham elas mesmas como agentes de transformação social. É imprescindível que, segundo aqueles que engendraram a referida 'mensagem educativa', nosso vizinho não tema em ter de intervir em assuntos privados, e que não lhe dizem respeito, tão-somente porque ele deve pensar a partir de agora que isso lhe diz respeito sim. Se a velha propaganda boca a boca é infalível para o mercado, por que não poderíamos também, cada um de nós, exercer as funções públicas contra o desleixo social? O caso que foi apresentado, com risco de morte, serve como um caso-limite para alguns outros casos 'menos mortais' de nosso cotidiano, e que não deixam de requerer a mesma aplicação cidadã.
Na era da vigilância desmedida, os civis são convidados regularmente a exercer em seu dia a dia o papel de vigilantes, acompanhado da antiga crença de que isso é feito para o bem comum. Mas jamais devemos nos esquecer que o 'bem comum' é um eufemismo, que serve para ocultar a parcela da sociedade que realmente ganha com isso. A difícil questão está em saber quem lucra com essa mudança de comportamento na vida social. A mim, não me parece arriscado dizer quem perde: a massa que, iludida pela tv, se vê promovida de seu anonimato a uns parcos quinze minutos de fama. A fama de se comportar politicamente correta, ou antes, como querem que nos comportemos.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Assim caminha a humanidade...


Quando Sócrates dizia que "virtude é conhecimento" estava enunciando um principio básico da finalidade última da ação humana: para agir corretamente é preciso ter acesso às informações que lhe dizem respeito. A liberdade no bem agir depende dos dados disponíveis para o homem ponderar a decisão mais acertada, e não poucos são os que acreditam que vivemos em uma época de luzes, livres como nunca, porque temos hoje mais acesso a informações. A que informações? Acreditamos mesmo que nos serão dadas todas as informações importantes para nossa decisão acertada? Não parece, antes, que se faz exatamente um acerto prévio do que são consideradas informações importantes, para levar os homens a decidirem o que querem exatamente aqueles que selecionam o que é importante? A atual situação dos meios de informação nos deixa com uma responsabilidade acachapante, muito pouco perceptível para quem nunca se deu ao trabalho de ir procurar as informações mais justas: o homem comum é deixado à sua própria sorte, dividido entre ter de ganhar a vida com trabalho e estudo, e ter ainda de procurar saber se o que está sendo dito por aí é de fato como se diz. Não me espanta que a maior parte da população, atarefada com sua sobrevivência, deixe o trabalho de se informar para os jornais e a televisão, deixando nas mãos de certas criaturas desconhecidas, ocultas por trás das redações, a responsabilidade de decidirem por elas. Imersas em conquistar um lugar ao sol, ou apenas um dinheiro qualquer ao fim do mês, as almas humanas seguem alienadas daquilo mesmo que as torna humanas, quer dizer, o senso de responsabilidade pelas suas decisões. Nesse ponto estão de acordo a doutrina cristã e o pensamento ateu de Sartre, além do sistema jurídico de que dispomos, para dar um exemplo laico. Antes de estar no trabalho e na luta pela sobrevivência, como gostaria o materialismo de Marx, a formação do homem está na sua consciência decisória, a partir da valoração que faz de si e do mundo que o cerca, e sem a qual pode-se chegar a ganhar o mundo inteiro e perder a própria alma. Ainda assim, pensa o homem comum: "não tenho tempo para pensar!" Esse paradoxo flagrante é tão-somente um eco de outro, bem mais profundo, muito próximo da formulação que o pai da filosofia havia dado a partir da frase que trouxemos no início: se "virtude é conhecimento", então "ninguém comete o mal senão por ignorância", e com isso entendemos melhor a miséria de nossos dias, em que as pessoas preferem ser ignorantes, mesmo que isso lhes custe a existência. Afinal, para que se preocupar com o que acontece? Não é muito mais fácil deixar a vida levar, ouvindo o que se diz por aí? Essa coisa de procurar saber e pensar é coisa de desocupado, há uma vida para ganhar lá fora! Não foi o próprio Sócrates quem disse "só sei que nada sei"? Então, deixa a coisa assim mesmo que se melhorar estraga. De minha parte, faço coro com Lulu Santos: "assim caminha a humanidade, com passos de formiga e sem vontade...", com uma única ressalva: as formigas não fazem senão o que lhes é natural.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Política, pra quê?

Posto aqui um texto que publiquei em meu blog pessoal, em agosto de 2011, e que continua bastante atual. Nele utilizo quase todas as técnicas de conclusão, então vale a pena dar uma lida e tentar identificar quais são. Boa leitura!


O que é a política? A pergunta pode soar um tanto esquisita, já que estamos no Brasil. Mas a esquisitice parece querer dizer exatamente isso - não temos nenhuma familiaridade com a política, senão com o papel vergonhoso que nossos representantes adoram representar no congresso. Por aqui, quando se fala em política se pensa em corrupção, em descaso, em safadeza, como se a imagem da política para nós fosse uma mistura diabólica de malandro da Lapa, playboy engomadinho e uma loira bem devassa. Mas talvez isso seja um sinal, não muito bom, mas um sinal de que as coisas podem ser modificadas. Bastaria que se entendesse que a política não é lá muito distante assim de nós, e que somos de igual modo malandros, playboys, devassos. Reclamar de quem então? A voz do povo é a voz de Deus, dizem as más línguas, mas talvez seja, ao contrário, a voz das profundezas mais obscuras de nossa natureza tupiniquim. Afinal, nossos representantes nos representam, e se estivéssemos assim tão insatisfeitos com a encenação deles não estaríamos inertes diante da TV ou do jornal, vendo a farsa acontecer bancada por nós. A nossa situação está deveras preocupante, mas sempre há um jeitinho, o bom jeitinho brasileiro, para saber lhe dar com a crise. A prefeitura do Rio está falida? O Estado do Rio permanece um esgoto de corrupção? Que nada! O importante é que o inverno está terminando, o verão vem chegando com tudo, e aí poderemos pedir aquela cervejinha, curtir uma praia das centenas de praias cariocas, cobiçando as loiras de plantão, com direito a fio dental e, se tiver algum dinheiro, até um beijinho. Pois é isso que importa, enfim. Nossa natureza não quer saber muito de formalidades. Deixe o terno para aqueles malandros e devassos do planalto. Fiquemos aqui pagando pra ver, literalmente, o circo pegar fogo, sonhando um dia que fosse na nossa cama...